segunda-feira, novembro 28

Esperança


"Quero trazer à memória o que me pode dar esperança." Lm 3.21

   Devastação, dor, tristeza, sofrimento e solidão são adjetivos que mesmo se somados, não expressam o turbilhão de sentimentos que afloravam no profeta Jeremias ao ver a terra de seus ancestrais, completamente, irreconhecível.
   A amor e zelo de Israel por seu Deus, expresso pela observância de seus mandamentos, por sacerdotes íntegros e reis que buscavam a Deus com inteireza de coração, nos remetem, expressivamente, aos dias de Davi. 
   Davi nunca foi o marco do homem irrepreensível, mas sim, o baluarte do sincero arrependimento, sendo capaz de enxergar a extensão de suas falhas, pecados e mazelas pela simples exposição de suas ações. 
   Um homem notável, mas não pelos seus bens e status social, mas pela capacidade de enxergar além de si mesmo, indo ao encontro do seu próximo e de seu Deus, ao ser confrontado com seus próprios pecados.
   Um exemplo como o de Davi costuma perdurar por gerações. A extensão que cada um de seus atos praticados alcançou, sem qualquer pretensão, ultrapassou o objetivo maior de honrar o propósito para o qual foi chamado como rei de Israel.
   Talvez, Jeremias tenha se lembrado do bom exemplo deixado por Davi. Vale lembrar que em Davi as doze tribos se mantiveram num estado de união como nunca antes fora e que nunca mais foi alcançado, depois dele. Nos dias de Jeremias, as doze tribos já não compactuavam, o rei vigente não possuía o mesmo caráter de Davi, seus subordinados não tinham temor e tremor por Deus. 
    Em sua grande parte, eram apenas homens que sabiam se impor pelo status que possuíam e pela entonação de suas pronunciações, oprimindo qualquer pensamento contrário ao deles.
   Seus sacerdotes e profetas nada mais eram do que rascunhos distorcidos e corrompidos, que em nada poderiam ser comparados com àqueles que foram, decididamente, elegidos por Deus para cumprir com tais funções.
   Como se não bastasse toda a corrupção moral de sua época, Jeremias teve que assistir as cidades históricas  de Israel serem reduzidas a ruínas e pó, a custo de suor e sangue de seus irmãos de sangue. Quem pode dizer quantos corpos Jeremias não encontrou pelo, caminho enquanto confrontava a realidade vivida com o deleite de um passado glorioso, questionando-se porque nenhum de seus contemporâneos deu atenção às palavras que professava, sendo agora tarde demais para qualquer uma delas...
   A fase de suplicar por um povo que não buscava a Deus havia passado. Após a destruição, a sensação de pesar do profeta, parece não lhe permitir mais nenhuma lágrima de dor. O que está feito, está feito!
   No entanto, ao ver a terra que mana leite e mel devastada e assolada, seu povo dizimado, as cidades em ruínas, Jeremias muda, drasticamente, o ângulo pelo qual via todas as coisas e resolve olhar não para o presente assolador, mas para o futuro promissor, recordando todas as promessas e o poder daquele que tudo pode fazer, quando é de sua vontade.
    Não há mais o que questionar! O profeta sabe que o Juízo foi retardado por tempo longo demais e que, fatalmente, seria executado.
   No entanto, após o profeta ter perdido, violentamente, tudo o quanto amava, ele se permitiu enxergar algo que, até então, era inexplorado, a mesma força que todos os renascidos em Cristo partilham, a esperança.
   Apesar dele não poder enxergar com olhos humanos a restauração completa de seu povo, ele crê baseando-se nas fiéis promessas de Deus, todas elas facilmente encontradas nas Escrituras Sagradas, e tornam-se, para o profeta, seu alicerce e sua rocha.
   A palavra empenhada que não volta vazia, repassada de geração em geração. O verbo que cumpre toda a vontade de Deus desde a criação. O registro que contém todas suas promessas aliadas, concomitantemente, à incapacidade deste mesmo Deus mentir, tornaram-se a esperança de Jeremias. O verbo que outrora se tornaria carne, torna-se a esperança de Jeremias. Após uma das lutas mais penosas de sua vida, tentando insistentemente abrir os olhos de seu povo, suplicando constantemente pelo retardamento do juízo sobre o mesmo, Jeremias reencontra a esperança na palavra que não volta vazia, ao trazer a memória aquilo que lhe dava esperança...


   Graças a Deus, por Jeremias ter nos ensinado que no fim de todas as coisas, mesmo que o presente não nos pareça promissor, a nossa esperança sempre estará nEle, pois é incapaz de mentir.


   Que nos momentos mais tenebrosos, possamos ser como Jeremias. Quanto a mim, também quero, sempre, "...trazer a memória aquilo que me dá esperança..."

Este texto está licenciado sob uma Licença Creative Commons.
Postado por Ricardo Inacio Dondoni

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